REVISÃO
Atenção primária à saúde, continuidade do cuidado e os impactos no manejo de doenças crônicas: Uma revisão de literatura
Primary health care and continuity of care and their impact on the management of chronic diseases: A literature review
Lucas Rodrigues Pereira Barros1, Maria Fernanda Teixeira Peres Machado2, Joana Gama Canal3, Bernardo Sander Corrêa de Souza4
1Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG), Betim, MG, Brasil
2Faculdade de Medicina de Barbacena (FAME/FUNJOB), Barbacema, MG, Brasil
3Faculdade de Medicina de Campos (FMC), Campos dos Goytacazes, RJ, Brasil
4Faculdade Ciências Médicas de Minas Gerais (FCM-MG), Belo Horizonte, MG, Brasil
Recebido em: 1 de Outubro de 2025; Aceito em: 15 de Outubro de 2025.
Correspondência: Lucas Rodrigues Pereira Barros, lucasbarros173@gmail.com
Como citar
Barros LRP, Machados MFTP, Canal JG, Souza BSC. Atenção primária à saúde, continuidade do cuidado e os impactos no manejo de doenças crônicas: Uma revisão de literatura. Fisioter Bras. 2025;26(5):2689-2701. doi:10.62827/fb.v26i5.1105
Introdução: As doenças crônicas não transmissíveis representam importante desafio para os sistemas de saúde, exigindo estratégias de manejo contínuo, monitoramento regular e cuidado integral. A Atenção Primária à Saúde (APS) desempenha papel central na coordenação, prevenção e acompanhamento desses pacientes, promovendo adesão terapêutica e redução de complicações. Objetivo: Realizou-se uma revisão bibliográfica para sintetizar evidências sobre a APS e a continuidade do cuidado, com foco nos impactos no manejo de doenças crônicas, práticas multiprofissionais, uso de tecnologias e estratégias organizacionais para promoção da integralidade do cuidado. Métodos: Trata-se de uma revisão bibliográfica de caráter descritivo e analítico, fundamentada em publicações nacionais e internacionais disponíveis nas bases Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), PubMed e Scopus. Foram incluídos artigos, revisões, dissertações, estudos de caso e relatórios institucionais publicados entre 2010 e 2025, em português, inglês e espanhol, abordando a APS, continuidade do cuidado e manejo de doenças crônicas. Foram excluídos relatos de opinião isolados, entrevistas e materiais duplicados. A seleção ocorreu em três etapas: identificação, leitura de títulos e resumos, e leitura integral dos textos elegíveis. Resultados: A literatura aponta que modelos de APS estruturada, com equipes multiprofissionais, protocolos clínicos padronizados, articulação entre níveis de atenção e incorporação de tecnologias digitais, estão associados à melhora do controle de doenças crônicas, adesão ao tratamento, redução de complicações e maior satisfação dos pacientes. Estudos destacam que a continuidade do cuidado fortalece vínculos entre pacientes e profissionais, otimiza o monitoramento longitudinal e facilita a detecção precoce de intercorrências. Barreiras incluem desigualdades regionais, insuficiência de capacitação profissional e lacunas na implementação de políticas públicas integradas. Conclusão: A APS estruturada e a continuidade do cuidado desempenham papel determinante no manejo eficaz de doenças crônicas, promovendo integralidade do cuidado, melhora dos desfechos clínicos e redução de complicações. Investimentos em capacitação profissional, tecnologias de suporte ao cuidado, centralização de fluxos assistenciais e políticas de saúde integradas são essenciais para otimizar o cuidado e ampliar os benefícios da APS à população.
Palavras-chave: Atenção primária à saúde; Doenças Crônicas; Continuidade da Assistência ao Paciente.
Introduction: Non-communicable chronic diseases represent a significant challenge for healthcare systems, requiring continuous management strategies, regular monitoring, and comprehensive care. Primary Health Care (PHC) plays a central role in coordinating, preventing, and monitoring these patients, promoting treatment adherence and reducing complications. Objective: This study conducted a literature review to synthesize evidence on PHC and continuity of care, focusing on their impact on chronic disease management, multidisciplinary practices, use of technologies, and organizational strategies to promote comprehensive care. Methods: This is a descriptive and analytical literature review based on national and international publications available in the Virtual Health Library (VHL), Latin American and Caribbean Health Sciences Literature (LILACS), PubMed, and Scopus. Included were articles, reviews, dissertations, case studies, and institutional reports published between 2010 and 2025, in Portuguese, English, or Spanish, addressing PHC, continuity of care, and chronic disease management. Isolated opinion pieces, interviews, and duplicate materials were excluded. The selection process comprised three stages: identification, screening of titles and abstracts, and full-text assessment of eligible studies. Results: The literature indicates that structured PHC models with multidisciplinary teams, standardized clinical protocols, integration across care levels, and the incorporation of digital technologies are associated with improved chronic disease control, treatment adherence, reduced complications, and higher patient satisfaction. Studies emphasize that continuity of care strengthens patient-professional relationships, optimizes longitudinal monitoring, and facilitates early detection of health issues. Barriers include regional inequalities, insufficient professional training, and gaps in the implementation of integrated public health policies. Conclusion: Structured PHC and continuity of care play a crucial role in effective chronic disease management, promoting comprehensive care, improved clinical outcomes, and reduced complications. Investments in professional training, care-support technologies, streamlined care pathways, and integrated health policies are essential to optimize care and expand the benefits of PHC to the population.
Keywords: Primary Health Care; Chronic Diseases; Continuity of Patient Care.
As doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) representam um dos maiores desafios de saúde pública contemporâneos, devido à sua elevada prevalência, associação com morbimortalidade e impacto econômico e social significativo. Condições como hipertensão arterial, diabetes mellitus, doenças cardiovasculares e respiratórias crônicas configuram-se como causas importantes de incapacidade e redução da qualidade de vida em diferentes faixas etárias, especialmente na população idosa [1,2].
Nesse cenário, a APS assume papel estratégico, visto que é a principal porta de entrada do Sistema Único de Saúde (SUS) e o nível responsável pela longitudinalidade, integralidade e coordenação do cuidado [3,4,5]. A APS possibilita a identificação precoce de fatores de risco, a realização de ações de promoção e prevenção, bem como o acompanhamento contínuo e multidisciplinar dos indivíduos com condições crônicas [6-8].
A continuidade do cuidado, entendida como a articulação eficaz entre serviços, profissionais e usuários, constitui elemento essencial para o manejo das DCNT[10]. Quando bem estruturada, reduz internações hospitalares, previne complicações, melhora a adesão ao tratamento e fortalece o vínculo terapêutico. Entretanto, persistem desafios relacionados à fragmentação da rede, insuficiência de recursos e desigualdades regionais, que comprometem a efetividade das políticas públicas voltadas para o enfrentamento das doenças crônicas [11].
A síndrome dos ovários policísticos (SOP) é uma das endocrinopatias mais prevalentes em mulheres em idade reprodutiva, caracterizada por alterações hormonais, metabólicas e ovulatórias. Essa condição está frequentemente associada a repercussões psicológicas significativas, como sintomas de ansiedade e depressão, comprometimento da autoestima e impacto negativo na qualidade de vida e na função sexual. Tais desfechos evidenciam a necessidade de abordagens terapêuticas integradas, que extrapolem o manejo puramente ginecológico e endócrino, incorporando estratégias que promovam saúde mental, bem-estar e qualidade de vida das pacientes [12].
Nesse contexto, a fisioterapia surge como uma ferramenta complementar fundamental no cuidado de mulheres com SOP. Programas estruturados de atividade física, conduzidos de forma individualizada, têm demonstrado eficácia na redução de sintomas depressivos e ansiosos, na melhora da autoestima e na promoção da qualidade de vida, atuando tanto nos aspectos fisiológicos, como resistência insulínica e controle de peso, quanto nos psicossociais. A integração da fisioterapia a programas multidisciplinares de atenção primária fortalece a abordagem holística do cuidado, alinhando-se aos princípios de integralidade, longitudinalidade e coordenação do SUS [13].
Diante desse contexto, torna-se relevante compreender de que forma a APS e a continuidade do cuidado impactam o manejo das doenças crônicas, possibilitando refletir sobre avanços, limites e potencialidades do sistema de saúde. Descreveu-se sobre a relação entre a Atenção Primária à Saúde, a continuidade do cuidado e os impactos no manejo de doenças crônicas.
Trata-se de uma revisão bibliográfica de caráter descritivo e analítico, fundamentada em publicações nacionais e internacionais disponíveis na Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Scientific Electronic Library Online (SciELO), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), United States National Library of Medicine (PubMed) e Oxford Research Encyclopedia. Foram considerados estudos publicados entre 2018 e 2025, em consonância com os objetivos do trabalho.
A questão norteadora foi elaborada segundo o protocolo PICOTT: Quais são os impactos da Atenção Primária à Saúde (P) e da continuidade do cuidado (I) no manejo de doenças crônicas (C), comparados a modelos assistenciais sem continuidade estruturada (C), em termos de coordenação do cuidado, adesão terapêutica, desfechos clínicos e utilização de serviços de saúde (O), segundo evidências obtidas em estudos publicados entre 2018 e 2025 (T), incluídos em revisões, estudos observacionais e relatos analíticos (T)?
As buscas foram realizadas utilizando descritores controlados (MeSH/DeCS) selecionados de acordo com a questão de pesquisa: “Primary Health Care”, “Continuity of Patient Care”, “Chronic Disease”, “chronic disease management”, “care coordination” e “health services accessibility”. Para a combinação dos termos empregaram-se os operadores booleanos AND e OR, formando estratégias de busca como: “Primary Health Care” AND “Chronic Disease” AND “Continuity of Patient Care”;“Chronic disease management” AND “care coordination” OR “primary health care” e “Continuity of care” AND “health outcomes” AND “primary care”.
Foram considerados para inclusão: artigos originais, revisões de literatura, diretrizes clínicas, estudos epidemiológicos, capítulos de livros, dissertações e teses que abordassem a relação entre APS, continuidade do cuidado e manejo de doenças crônicas. Admitiram-se publicações em português, inglês e espanhol, com texto completo disponível.
Foram definidos como critérios de exclusão: estudos exclusivamente sobre atenção secundária/terciária sem interface com APS; trabalhos restritos a populações pediátricas quando o foco do estudo fosse outra faixa etária; relatos de caso isolados sem discussão ampliada; resumos de congresso sem texto completo; e materiais duplicados entre bases de dados.
A seleção dos estudos ocorreu em três etapas sequenciais: (1) identificação e remoção de duplicatas; (2) leitura dos títulos e resumos (triagem); (3) leitura integral dos textos elegíveis. Todo o processo de busca e triagem foi conduzido de forma independente por dois revisores, com divergências resolvidas em consenso. Quando necessário, recorreu-se a um terceiro revisor para desempate.
A análise dos dados incluiu a sistematização das informações referentes aos objetivos, metodologias, principais achados e conclusões dos estudos. Os resultados foram organizados de forma narrativa, permitindo uma visão crítica sobre os impactos da APS e da continuidade do cuidado no manejo de doenças crônicas cobrindo estrutura organizacional, processos de atenção, desfechos clínicos, adesão terapêutica e utilização de serviços.
Diante dos critérios estabelecidos, foram identificados 132 estudos nas bases selecionadas. Após a remoção de 27 duplicatas, restaram 105 artigos para leitura de títulos e resumos. Destes, 90 foram excluídos por não atenderem aos critérios de inclusão (tema discordante, população fora do escopo, tipo de publicação inadequado). Assim, 15 artigos foram avaliados na íntegra, resultando em 14 estudos incluídos na revisão final ilustrados na Figura 1.
Figura 1 - Fluxograma da busca de artigos selecionados para a revisão
O Quadro 1 apresenta os 14 estudos incluídos nesta revisão, abrangendo diferentes delineamentos metodológicos e principais achados relacionados à APS, DCNTs e medidas fisioterapêuticas. A tabela resume de forma clara os tipos de estudo, objetivos e o desfecho.
Quadro 1 - Síntese dos estudos utilizados na construção do presente artigo
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Autor/Ano |
Estudo |
Tipo de Estudo |
Objetivo |
Principais Achados |
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Da Silva EFG et al., 2024 |
Uso de tecnologias em doenças crônicas na Atenção Primária à Saúde: Revisão integrativa |
Revisão integrativa |
Analisar o uso de tecnologias digitais no manejo de DCNT na APS |
Tecnologias ampliam monitoramento, aderência e potencialmente reduzem complicações. |
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Cardoso AGF, 2023 |
Os cuidados às pessoas com DCNT associados aos atributos da APS |
Dissertação (Mestrado) |
Avaliar atributos da APS relacionados ao cuidado às DCNT |
Longitudinalidade e integralidade são essenciais para manejo eficaz. |
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Brito LM et al., 2023 |
Prevenção de doenças crônicas no contexto da Atenção Primária à Saúde |
Revisão narrativa |
Identificar estratégias preventivas para DCNT na APS |
Intervenções educativas, rastreamento precoce e acompanhamento contínuo reduzem incidência de DCNT. |
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Coelho ACR et al., 2023 |
Os principais desafios das políticas públicas de saúde para o enfrentamento das DCNT em municípios do Nordeste |
Estudo descritivo |
Avaliar desafios da gestão pública no enfrentamento das DCNT |
Fragilidades na infraestrutura e financiamento limitam efetividade das ações. |
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Da Silva Lopes M et al., 2022 |
Processo de trabalho na atenção básica na assistência às doenças crônicas |
Estudo descritivo |
Avaliar organização do processo de trabalho da APS |
Trabalho em equipe multiprofissional melhora efetividade no manejo das DCNT. |
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Nunes Oliveira C et al., 2022 |
Physicians’ and nurses’ perspective on chronic disease care practices in Primary Health Care in Brazil: a qualitative study |
Estudo qualitativo |
Explorar percepções de profissionais sobre práticas assistenciais |
Identificadas barreiras estruturais e importância da coordenação multiprofissional. |
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Draeger VM et al., 2022 |
Práticas do enfermeiro no monitoramento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis na APS |
Estudo qualitativo |
Avaliar práticas de monitoramento de DCNT na APS |
Enfermeiros contribuem para adesão terapêutica, monitoramento e coordenação do cuidado. |
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Barrio-Cortes J et al., 2021 |
Chronic diseases in the geriatric population: morbidity and use of primary care services according to risk level |
Estudo epidemiológico |
Analisar morbidade e uso da APS em idosos com DCNT |
Uso intensivo da APS associado a melhor acompanhamento e menor internação. |
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Silocchi C et al., 2021 |
Institucionalização das práticas de atenção às condições crônicas e gestão do cuidado na APS |
Estudo descritivo |
Analisar institucionalização das práticas de gestão do cuidado |
Estruturas institucionais fortalecem continuidade do cuidado e resolutividade. |
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Littenberg B et al., 2021 |
Integrating behavioral health & primary care for multiple chronic diseases: Clinical trial of a practice redesign toolkit |
Ensaio clínico |
Avaliar integração saúde comportamental + APS para DCNT |
Integração melhora qualidade do cuidado e desfechos clínicos. |
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Nogueira AJS & Pachú CO, 2021 |
A atuação do profissional de enfermagem frente às Doenças Crônicas na APS: uma revisão integrativa |
Revisão integrativa |
Identificar práticas de enfermagem no cuidado às DCNT |
Enfermeiros desempenham papel central em educação em saúde e acompanhamento clínico. |
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Jimenez Carrillo M et al., 2020 |
Comprehensive primary health care and non-communicable diseases management: a case study of El Salvador |
Estudo de caso |
Avaliar modelo de APS no manejo de DCNT |
Modelo integral promove equidade, acesso e continuidade do cuidado. |
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Araújo LU et al., 2019 |
Segurança do paciente e polimedicação na Atenção Primária à Saúde: pesquisa transversal em pacientes com doenças crônicas |
Estudo transversal |
Avaliar prevalência de polimedicação em pacientes crônicos |
Alta taxa de polimedicação; risco aumentado de eventos adversos e necessidade de revisão medicamentosa. |
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Mendes EV, 2018 |
O cuidado das condições crônicas na atenção primária à saúde |
Revisão teórica |
Discutir o papel da APS no cuidado às DCNT |
APS estruturada é pilar para manejo efetivo das condições crônicas. |
Em relação aos principais achados, verificou-se que o uso de tecnologias digitais e ferramentas de monitoramento na APS contribui significativamente para a adesão ao tratamento, acompanhamento contínuo e redução de complicações em pacientes com doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) [1,5,9,11]. As revisões integrativas e narrativas [1,3,5,9,11] evidenciaram que a incorporação de estratégias tecnológicas, práticas de enfermagem e educação em saúde promove melhora nos desfechos clínicos e na gestão integral do cuidado.
Estudos descritivos e transversais [4,6,10,12,13] indicaram que barreiras institucionais, infraestrutura insuficiente e desafios na implementação de políticas públicas impactam negativamente a efetividade do cuidado às DCNT, especialmente no que se refere à polimedicação e à coordenação do acompanhamento clínico. Dados qualitativos [6,7,12] ressaltaram ainda a importância da atuação multiprofissional, do trabalho em equipe e da integração entre saúde comportamental e APS para otimizar os resultados clínicos e a experiência do paciente.
Dentro dessa perspectiva multiprofissional, a fisioterapia desponta como uma das áreas de maior impacto na reabilitação e prevenção de agravos associados às DCNT. Estudos [13,14] mostraram que a atuação fisioterapêutica no âmbito da APS contribui para o controle de sintomas musculoesqueléticos, melhora da capacidade funcional e promoção do autocuidado em pacientes com condições crônicas, como hipertensão, diabetes e doenças respiratórias. Além disso, a presença do fisioterapeuta nas equipes da Estratégia Saúde da Família (ESF) fortalece a reabilitação precoce, reduz hospitalizações evitáveis e favorece o retorno das atividades cotidianas, especialmente em populações vulneráveis e com limitação funcional.
Outro achado relevante refere-se à incorporação de tecnologias digitais e telemonitoramento nas práticas fisioterapêuticas. Pesquisas recentes [13,14,15] apontam que a fisioterapia digital, por meio de plataformas de orientação e exercícios supervisionados à distância, amplia o alcance dos cuidados, melhora a adesão ao tratamento e permite o acompanhamento contínuo de parâmetros funcionais. Essa integração entre fisioterapia e tecnologia na APS demonstra um avanço significativo na personalização do cuidado e na gestão longitudinal das DCNT, reforçando o papel do fisioterapeuta como agente ativo no controle de complicações e na melhoria da qualidade de vida dos pacientes.
Um ensaio clínico [8] demonstrou que modelos de integração entre APS e atenção comportamental melhoram a qualidade do cuidado, promovendo resultados positivos em múltiplas DCNT. Estudos de caso [11] reforçaram a relevância de modelos APS estruturados, que promovem equidade, acesso ampliado e continuidade do cuidado. Por fim, análises teóricas [14] destacaram que a APS organizada e centrada no paciente constitui pilar essencial para o manejo efetivo de condições crônicas, enfatizando a necessidade de práticas sistemáticas, protocolos claros e avaliação contínua da qualidade assistencial.
Em síntese, os resultados indicam que a combinação de tecnologias digitais, práticas de enfermagem qualificadas, integração multiprofissional e políticas públicas estruturadas contribuem para o manejo efetivo de DCNT na APS, melhorando adesão, monitoramento e desfechos clínicos, mesmo em contextos de desafios institucionais e recursos limitados [1,4,5,6,7,8,9,10,11,12,13,14].
Descreveu-se que a continuidade do cuidado e o fortalecimento da APS desempenham papel central no manejo de doenças crônicas, respondendo à questão norteadora do estudo: quais são os impactos da APS e da continuidade do cuidado na gestão de condições crônicas, considerando adesão terapêutica, monitoramento, prevenção de complicações e integralidade do atendimento? A análise dos estudos indica que práticas estruturadas de APS, quando articuladas com tecnologias digitais, protocolos clínicos padronizados e equipes multiprofissionais, contribuem significativamente para melhores desfechos em pacientes crônicos [1,5,8,9].
Os achados convergem com pesquisas que destacam a importância da incorporação de tecnologias digitais no acompanhamento de pacientes, permitindo monitoramento remoto, reforço do autocuidado e detecção precoce de descompensações clínicas [1,5,9]. Além do impacto tecnológico, a literatura evidencia que a capacitação contínua de profissionais e a padronização de fluxos assistenciais promovem maior resolutividade, reduzindo lacunas assistenciais e promovendo adesão ao tratamento [4,6,10]. Esses fatores demonstram que o manejo de doenças crônicas não depende apenas de intervenções pontuais, mas de uma estratégia organizada, longitudinal e centrada no paciente.
Outro aspecto relevante é o papel das políticas públicas e da gestão do cuidado na APS. Estudos descritivos e transversais [4,6,12] mostraram que lacunas estruturais, escassez de recursos e limitações na coordenação entre níveis de atenção comprometem a efetividade do cuidado, mesmo em contextos com equipes multiprofissionais. Nesse sentido, o fortalecimento de protocolos institucionais, integração entre unidades de saúde e participação ativa do paciente são determinantes para reduzir complicações, hospitalizações evitáveis e eventos adversos.
Nesse cenário, a fisioterapia tem se destacado como uma das áreas mais estratégicas dentro da APS para o cuidado de pacientes com doenças crônicas. O fisioterapeuta atua na prevenção, promoção e reabilitação da saúde, contribuindo para o controle de condições como hipertensão, diabetes, DPOC e doenças osteomusculares, além de auxiliar na manutenção da capacidade funcional e da autonomia do paciente. Inserido nas equipes multiprofissionais da Estratégia Saúde da Família (ESF), o fisioterapeuta realiza acompanhamento contínuo, orientações sobre exercícios terapêuticos e práticas corporais adaptadas, reduzindo o sedentarismo e melhorando a adesão ao tratamento. Essas ações fortalecem o vínculo com a comunidade e favorecem o autocuidado, pilares fundamentais do modelo de atenção crônica [13,14].
Além disso, a incorporação da fisioterapia às práticas de cuidado na APS amplia a resolutividade dos serviços e melhora os indicadores de saúde. Intervenções fisioterapêuticas associadas ao uso de tecnologias digitais e protocolos clínicos padronizados permitem monitoramento remoto de sintomas, prevenção de complicações musculoesqueléticas e respiratórias e melhora da qualidade de vida. Essa integração possibilita uma abordagem centrada no paciente, em que o fisioterapeuta atua tanto na atenção domiciliar quanto no ambiente comunitário, promovendo educação em saúde, suporte funcional e redução de hospitalizações evitáveis. Dessa forma, a fisioterapia consolida-se como componente essencial da atenção integral, reforçando o papel coordenador da APS na linha de cuidado das doenças crônicas.
A integração da APS com saúde comportamental, como demonstrado em ensaios clínicos [8], reforça que o cuidado contínuo deve englobar aspectos clínicos, psicossociais e preventivos. Programas estruturados que combinam acompanhamento multiprofissional, monitoramento remoto e educação em saúde resultam em melhor adesão, menor incidência de descompensações e maior satisfação do paciente. Essa abordagem evidencia a importância de estratégias holísticas, nas quais o cuidado de doenças crônicas é acompanhado de atenção à qualidade de vida, prevenção de complicações e suporte à autonomia do paciente.
Estudos de caso [11] e revisões teóricas [13,14] enfatizam que a APS deve ser o eixo articulador das redes de atenção, promovendo integralidade, longitudinalidade e coordenação do cuidado. A continuidade assistencial possibilita rastreamento regular, identificação precoce de riscos e ajustes terapêuticos personalizados, o que se traduz em menor morbimortalidade e maior eficiência no manejo das doenças crônicas. Assim, os resultados reforçam que estratégias fragmentadas ou sem integração entre níveis de atenção limitam os benefícios da APS, comprometendo tanto resultados clínicos quanto experiência do paciente.
Apesar dos avanços, persistem desafios importantes, como desigualdades regionais no acesso a serviços de APS qualificados, insuficiência de tecnologias de monitoramento, carga de polimedicação e déficit na capacitação profissional. Essas barreiras evidenciam que o simples aumento do número de unidades de APS não é suficiente; é necessário investimento em organização, protocolos padronizados, formação continuada e integração de políticas públicas com ações clínicas [4,6,12].
Como potencialidade, este estudo sintetiza evidências recentes sobre os impactos positivos da APS estruturada e da continuidade do cuidado, demonstrando que a implementação de tecnologias, protocolos clínicos e integração multiprofissional contribui significativamente para o manejo eficiente de doenças crônicas. Pesquisas futuras poderão avaliar a efetividade de diferentes modelos de atenção primária, considerando desfechos clínicos, psicossociais e de experiência do paciente.
O estudo apresenta como principais pontos fortes a análise abrangente de diferentes delineamentos metodológicos, incluindo revisões integrativas, ensaios clínicos, estudos descritivos e qualitativos, o que permitiu uma visão ampla sobre a gestão de doenças crônicas não transmissíveis na Atenção Primária à Saúde e o papel da continuidade do cuidado. Outro ponto positivo é a síntese de evidências recentes sobre o uso de tecnologias digitais, protocolos clínicos padronizados e integração multiprofissional, destacando práticas efetivas para adesão terapêutica, monitoramento contínuo e prevenção de complicações. Entre os pontos fracos, observa-se a heterogeneidade dos estudos incluídos, tanto em termos de população quanto de intervenções avaliadas, o que pode dificultar a generalização dos achados.
As limitações do estudo incluem a dependência de publicações disponíveis em bases específicas, o que pode ter excluído evidências relevantes em contextos regionais ou não publicados, e a predominância de estudos descritivos e revisões narrativas em detrimento de ensaios clínicos robustos. Apesar disso, a contribuição do estudo é significativa, ao fornecer um panorama consolidado das práticas de APS estruturada, reforçando a importância da continuidade do cuidado, da integração de serviços, da importância do trabalho multidisciplinar e do uso de tecnologias, oferecendo subsídios para políticas públicas, planejamento assistencial e futuras pesquisas voltadas para otimização do manejo de doenças crônicas não transmissíveis.
A APS quando estruturada e integrada com continuidade do cuidado exerce impacto direto no manejo de doenças crônicas, promovendo monitoramento regular, adesão ao tratamento, prevenção de complicações e melhora da qualidade de vida dos pacientes. As estratégias de cuidado multiprofissional, protocolos clínicos padronizados, uso de tecnologias digitais e articulação entre níveis de atenção são determinantes para resultados clínicos mais eficazes.
Apesar dos avanços apontados, persistem desafios como desigualdades regionais no acesso à APS qualificada, lacunas na capacitação profissional e limitações na integração de políticas públicas com a prática clínica. A superação dessas barreiras exige planejamento estratégico, investimento em infraestrutura, treinamento contínuo e implementação de modelos de atenção centrados no paciente.
Nesse contexto, a fisioterapia destaca-se como componente essencial no cuidado interdisciplinar oferecido pela APS, especialmente na prevenção e reabilitação de doenças crônicas. A atuação fisioterapêutica contribui para a melhora da capacidade funcional, controle de sintomas, promoção da autonomia e redução de hospitalizações evitáveis, fortalecendo o vínculo terapêutico e a adesão ao tratamento. Além disso, a incorporação de práticas de fisioterapia comunitária e o uso de tecnologias digitais, como o telemonitoramento e a prescrição de exercícios supervisionados à distância, ampliam o alcance e a efetividade das ações da APS, consolidando o papel do fisioterapeuta como agente fundamental na promoção da saúde e na prevenção de agravos.
A análise dos estudos demonstrou que a APS estruturada e contínua contribui significativamente para melhores desfechos clínicos, redução de complicações e promoção da integralidade do cuidado, reforçando sua centralidade no enfrentamento das doenças crônicas na população adulta.
Conflitos de interesse
Os autores declaram não haver conflitos de interesse.
Fonte de financiamento
Não houve financiamento.
Contribuição dos autores
Concepção e desenho do estudo: Barros LRP, Machado MFTP, Canal JG, Souza BSC; Análise e interpretação dos dados: Machado MFTP, Canal JG; Redação do manuscrito: Barros LRP, Machado MFTP, Canal JG, Souza BSC; Revisão do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Souza BSC, Barros LRP.
Referências
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